quarta-feira, 23 de março de 2011

Em vão

De repente, ele não via mais ela. Ela estava lá, mas ele não podia mais enxergar. Ou pensava que não podia. É sempre como se processa a mente de quem está num turbilhão de sentimentos. Confusão. Ele se via apaixonado. Mas pela primeira vez livre. As outras relações que havia acostumado e passado a considerar corretas, eram algo como dependência, repletas de egoísmo. Tudo que o pessoal costuma dizer que é paixão, mas não é. Paixão é intensa, intenção. Afeto, que no sentido radical quando falamos em paixão, pode ser algo como afetar, afetação. Nunca prisão. Se falarmos de amar, então...Doar, no sentido de partilhar. Não depender, não precisar.

Ela, tão viva que era, estava vivendo em uma montanha russa emocional. Não podia mais suportar. Mas insistiu, porque era puro o que sentia. Era verdadeiro, era livre. E deixou para ele um bilhete: "eu tento me aproximar, mas você se afasta". Eram assim os últimos dias. Insuportáveis. Pesados. Cobrados.

Ela cansou. E começou a encontrar o que estava quase morrendo dentro dela mesma: o amor próprio. E, apenas com isso e por isso, ela passou a não ser mais enxergada por ele, que insistia em procurar aquela que tanto desrespeitou. Ela entendeu que se ele fez tantos absurdos com ela, foi porque ela também permitiu. "Toma vergonha, menina!" - ela ouvia uma voz masculina, de um grande homem que passou pela vida dela. Quem sabe até mesmo o pai. E sentiu vergonha.

Ele, de tão indeciso, acabou decidido por ela. Mas ela havia decidido sem exatamente escolher, mas agindo, que não seria mais ele.

Vagava por todos os locais onde ela poderia estar. Onde certamente gostaria de estar. Mas, embora ela estivesse lá, ele não mais a reconhecia. Ficou desatinado e decidiu que ia busca-la até encontrar. A busca se mostrou, após alguns meses, angustiante e dolorida. Nunca mais poderia achar. Quando perguntavam para ele, completamente transformado pela dor da perda, se ainda doía, dizia ele, inconsolável e tão cafona (embora lindas) quanto são as declarações de amor:

- Só dói quando eu penso nela, e eu penso nela quando eu respiro.

*livre inspiração no livro "Malu de Bicicleta", de Marcelo Rubens Paiva, e de andanças por aí...

Um comentário:

Anônimo disse...

É, aquele ditado que "a gente só dá valor quanto perde" casa muito bem com essa situação.

Mas, o que me deixa feliz como eterna romântica realista que sou, é: "ela reencontrou o seu amor próprio".

Obrigada por nos brindar com o seu talento, Maria Tetê!

Bj grande!