quinta-feira, 25 de agosto de 2011

O caminho das borboletas

"O novo e o velho coexistem para que haja equilíbrio" - ela escreveu em seu pequeno caderno de viagens o que havia escutado em outro idioma no meio da multidão que visitava uma cidade em ruínas. Ficou pensando em seu avô, acamado após ser acometido por uma doença, que fez com que a família voltasse toda a atenção para aquela situação com a certeza de um término sem data marcada. Alguns, que há muito não se falavam, simplesmente porque a vida é assim, passaram a se encontrar quase diariamente, com o objetivo de prestar toda a assistência ao enfermo. A razão não era nada boa: doença. Mas alí havia sim a clara relação do velho com o novo. A doença motivou o resgate de uma referência que se perdeu na volatilidade do cotidiano. O velho dá suporte para o novo e o novo protege o velho, para que ele não esmoreça.
Absorta em seus pensamentos, se percebeu, em algum momento de consciência, que estava sozinha. Respirou fundo para recobrar a calma. Um pouco apreensiva, andou em círculos pela trilha. Gritou algumas palavras que não tiveram eco. Pensou na relação do novo e do velho. Pensou que, mais que o equilíbrio, essa relação seria um caminho.

A borboleta vive nessa relação do novo com o velho. Encapsulada no casulo está o corpo maduro que, na hora adequada, se livra da carapaça e, com asas novinhas, ganha o infinito das possibilidades.

"Devo seguir o caminho das borboletas" -pensou. E em poucos instantes, lá estavam elas, batendo as asas e a conduzindo para uma saída. Pouco importava se era a ideal, a esperada, a única. Mas era a possível naquele momento.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Alô? É o passado

Ficaram alguns meses sem notícia um do outro. Até que ele ligou para pedir uma ajuda: queria mudar de emprego. Da relação tinha ficado uma amizade muito bonita:
- Alô?
- Oi. Sou eu, tudo bem?
Na mesma hora, teve a sensação de ter o seguinte diálogo:
- Alô?
- Oi. Aqui é seu passado.
Achou que estava ficando maluca. Respirou e retomou a conversa:
- Oi. Tudo sim. Que surpresa essa ligação.
Ela tinha saudade dele. Não daquela relação homem-mulher, mas da amizade. Ela queria muito que ele fosse feliz.
- Estou precisando de uma força. Querendo procurar um trabalho melhor. Pensei que você podia me ajudar.
- Mas é claro.
E os dois conversaram. Riram e, no final, a pergunta:
- Mas, afinal, como você está?
- Ah, to feliz, mudei de casa, estou morando com uma garota legal...
Ela ficou muda. Achou que aquele sentimento estava no passado. Sentiu-se mal, tateou a mesa para procurar algo inexistente e acabou puxando uma cadeira.
- Que bacana! Parabéns. Se você está feliz é isso o que importa - disse muito sem graça.
Se despediram. Desligaram. Ela chorou. Sentiu vergonha. Ela não chorava por ainda amá-lo. Isso tinha ficado no passado. Ela chorava pelas escolhas que tinha feito e, agora, se arrependia. Pensou num outro diálogo possível com o passado:
- Alô?
- Oi. É o passado.
- Xô. Não quero mais falar com você, passou...
Mas isso não lhe era possível. O sentimento tinha invadido sem que ela permitisse. Ficou pensando que novamente havia sido preterida para realizar um de seus sonhos. O desejo dela, o que eles tinham planejado, estava acontecendo, mas com outra pessoa. Não era do sentimento por ele que ela tinha saudade. Mas dos planos. Ficou mastigando aquele 15 de julho, quando ele a procurou:
- Acho que poderíamos retomar, não sei...gosto de você. Ainda. Muito.
Ela não o deixou terminar de falar. Estava encantanda por outro alguém e simplesmente desprezou a oportunidade, que diferente da maior parte das vezes, aparecia novamente diante dela.
- É. Estou com outra pessoa. Na verdade, acho que a gente passou.
E agora sofria em pensar que havia feito a escolha errada. Porque o alguém pelo qual ela havia trocado ele, tinha feito a mesma coisa. Ou pior. Ela continuava sonhando as coisas para que outras pessoas realizassem no seu lugar.