segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Discurso de Formatura

Faz tempo que queria postar esse discurso, mas sempre deixava para depois. Após três anos, percebo que ele ainda, e cada vez mais, faz muito sentido: é o meu discurso de oradora da turma de jornalismo Cásper Líbero 2007. E um detalhe importante, a poesia que eu declamei no dia, e que está no final do discurso, é a mesma que meu pai, Antonio de Padua Cruz declamou em 1978, quando se formou.

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Discursos diferem em pouca coisa. A essência é sempre a mesma: olhar para trás, fazer um breve balanço de tudo o que aconteceu, de como tudo começou e apresentar perspectivas de um futuro que virou presente. O meu não poderia ser diferente, mas não quero falar de passado. Antonio Candido escreveu certa vez que “registrar o passado é falar dos que participaram de uma certa ordem de interesses em um momento particular que se deseja evocar”. E poderia falar algumas coisas de muitos de vocês que estão sentados aí, com quem dividi alegrias e tristezas. Mas também penso que no passado estão as lembranças, que devem ser partes íntimas e intocadas daquilo que nos dá saudade. Se sentimos saudade é porque valeu a pena. E isso, sim, é muito particular.

Ilustríssima Profa Tereza Cristina Vitali, em nome de quem saúdo todos os componentes da mesa, senhoras e senhores, caros colegas. Há quatro anos pensamos um projeto para nossas vidas. Prestamos vestibular e tínhamos uma vaga noção do que nos aconteceria. Queríamos mudar o mundo! Pensamento ingênuo, porém tão necessário naquele momento.

E se eu perguntar o que foi e o que é a Cásper Líbero, cada um de nós terá uma resposta diferente. A única semelhança está no objetivo: ser jornalista. Mas ainda não o somos: começa agora a caminhada. De antemão, posso apenas nos parabenizar porque fazemos parte do seleto grupo de 9% de brasileiros a concluir curso superior.

Daqui pra frente, muitas pessoas vão se destacar, mas outras tantas vão desistir no meio do caminho e procurar outros nortes. E daí? A vida é assim, feita de encontros e desencontros, lembrando o poeta. Viemos de lugares diferentes e trouxemos na bagagem histórias que pudemos compartilhar durante esses anos. E mudamos muito não? Ainda bem. Eu costumo dividir os anos de faculdade mais ou menos assim: expectativas primeiro-anistas baseadas em teorias que na prática não funcionavam; filosofias de boteco (e a realidade dos estágios) passam a fazer mais sentido que a sala de aula; desencanto e choque de realidade, dúvidas, muitas dúvidas; esgotamento clássico causado pela tríade trabalho, aulas e o famigerado TCC. E vamos sentir falta de tudo, estou certa disso. Um ciclo se fecha. Uma nova etapa começa: agora, mais que nunca, teremos que enfrentar a concorrência, os êxitos e os dissabores do mercado de trabalho. Alguns sairão empregados, mas para a maioria, mais uma luta começa. Pode soar piegas, mas nunca podemos esquecer dá responsabilidade que assumimos quando escolhemos essa profissão. Não se trata de ter foco, escrever um bom lead ou pensar no leitor. É ter comprometimento com a verdade e com a informação. E por falar em verdade, me lembrei de um texto de Carlos Drummond de Andrade. Conta a história que foi encontrada a porta da verdade e que ela estava aberta. Mas para adentrá-la havia uma condição: de que apenas meia pessoa entrasse de cada vez. A confusão esperada mostrou-se real: cada meia pessoa que entrava saía com meia verdade, que não coincidia com a meia verdade da outra metade de cada pessoa. Quando todos se rebelaram e destruíram a porta, descobriram que não havia uma verdade inteira, absoluta e cada um passou a aceitar a verdade que mais lhe conviesse, baseado na sua ilusão, na sua própria miopia. Como não evocar as aulas de ética com intermináveis discussões aparentemente infrutíferas como instrumento fundamental de reflexão da nossa profissão, daquilo que faremos daqui pra frente? Vamos lidar com esses relativismos em todo momento e temos que estar convictos daquilo que acreditamos. Teremos que nos posicionar perante os dilemas que vão surgir e fazer escolhas. Vamos pautar essas escolhas na ética e na dignidade (quem perdeu a dignidade no JUCA é bom começar a procurar...). Um fim glorioso não pode ser justificado por meios indignos.

Alguns podem estar pensando quão quixotescas são minhas palavras. Mas se as ouvirem nas entrelinhas compreenderão que falo do real. Que falo de trabalho e dedicação e passo atestado contra a arrogância e a desonestidade.

Não se trata de mudar o mundo. Isso é uma grande bobagem. Idealismo puro. E mais do que nunca precisamos de mais idéias e ações e menos ideologias verborrágicas. Estou falando sim em promover uma mudança dentro de nós mesmos. Vou fazer um pacto com vocês: nunca tenhamos medo de mudar, parar, voltar, seguir, recomeçar. E como já me alonguei demais, termino, com a licença de todos os presentes, declamando uma poesia que não fala de jornalismo, mas de alma, de ser humano, daquilo que precisamos ter em mente para ir tocando em frente. O texto é do escritor parnasiano e jornalista, colega nosso, Olavo Bilac. Chama-se “Credo”. O credo é uma profissão de fé, que sela a escolha que fizemos e pela qual estamos aqui hoje.



Crê no dever e na virtude.

É um combate insano e rude

A vida em que tu vais entrar.

Mas, sede bom ! Com esse escudo,

Serás feliz, vencerás tudo...

Quem nasce vem para lutar.



E crê no bem,

‘Inda que um dia

No desespero e na agonia

Te vejas pobre e injuriado,

Por toda gente desprezado

Perdoa o mal e crê no bem.



E crê na pátria,

Mesmo que a vejas

Cheias de idéias mal fazejas,

Em qualquer época infeliz.

Não abandones.

Porque a glória

Hás de ver mudar numa vitória

Em cada cicatriz.



E crê no amor !

Se pode a guerra

Cobrir de sangue toda a terra

Levando tudo à assolação.

Mas, pode límpida e sublime

Cair sobre um grande crime

Uma palavra de perdão