quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Anedota de uma mulher (in)dependente

Sempre fui uma mulher muito independente. Aos 14 anos arrumei meu primeiro emprego. À revelia, mas só de minha mãe. Meu pai desaprovava, mas no fundo bem que gostava, porque todo mês 10% do meu salário ia para cobrir despesas da casa. Como prestador de serviçoes, ele passou a trabalhar cada vez menos. Minha vontade era colocarr uma mochhila nas costas, mandá-lo à merda e cair na vida. Mas ainda não era a hora.
Fiz uma poupança com a grana que juntei dos 14 aos 18 anos e consegui comprar um carro no dia do meu aniversário de 19 anos. Era o símbolo da independência. Mas eu queria mais.
Ingressei na faculdade, mas continuei trabalhando e, agora, ganhando um pouco melhor. Aos 20 anos atingi o ápice da subsistência para uma recém-saída da adolescência: fui morar sozinha. E totalmente auto-suficiente. Aluguel, internet, água, luz, telefone: tudo por minha conta e risco. Mas eu queria mais. Me sentia vazia e inútil, por vezes, só. Ainda que cercada de gente, só.
E veio a depressão. Cheguei a achar que era isso o que faltava para que eu chegasse a plenitude da independência. Afinal, uma mulher independente tem problemas que precisa resolver sozinha, sofre pressões, passa por estresse, que culminam em depressão.

Mas eu queria mais.

Um dia tomei várias cartelas de calmantes e deitei. Tudo ficou preto e, depois, azul. E senti uma paz. Acordei, vomitei e fui passear. Foi então que eu o encontrei. Da troca de olhares para a cama foi um piscar de olhos, afinal, eu era uma mulher independente e bem resolvida, e deveria sanar minhas vontades sem sentir culpa. Começamos a namorar e decidi chamá-lo para morar comigo, situação aceita apenas por mulheres independentes. A maioria quer casar, véu, grinalda e toda pompa e circunstância. Mas eu, não.
Aos poucos fui gastando cada vez mais tempo na cozinha do que na academia, mais tempo lavando e passando roupa do que indo ao cinema, mais tempo varrendo a casa do que trabalhando fora. E me transformei numa típica dona-de-casa, situação muito transgressora, pois mudei radicalmente e mudanças radicais só são aceitas por mulheres independentes. Portanto, tudo certo.
E ele foi ficando áspero comigo. Não me trazia mais flores, nem dizia elogios, só quando eu dava algo em troca.
Aquela relação estava se degradando e eu, uma mulher independente, não poderia ficar de braços cruzados.
Numa noite, esperando que ele chegasse do trabalho, preparei um jantar, comprei vinho, rosas, perfumei a casa e a nossa cama.
Ele entrou, eu fui recebê-lo e receb, em troca, uma bordoada bem no meio da cara. E decedi que, independente de qualquer coisa, aquele era o meu lugar.